15 de agosto de 2018

Lula tucano

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Por puro gosto e não por necessidade – porque estou temporariamente de “licença” do ofício de repórter –, acompanho com afinco o noticiário de política. Vejo o que saiu nos jornais, leio os principais portais com cobertura na minha área de interesse, ouço rádios que discutem o tema e assisto na tevê aos debates e programas de entrevistas com os candidatos. Uma overdose.

O tempo que alguns dedicam ao programas de auditório, aos reality shows, às maratonas de séries norte-americanas, àquele programa musical que “só toca top” (propaganda enganosa, na certa) e aos alienígenas do History Channel, eu prefiro gastar com política. Aliás, eu também assisto ao “Alienígenas do Passado”, porém, quanto ao programas de auditório, falta-me estômago. Nem com sonrisal.

Essa overdose, muito provavelmente, está interferindo em meu sono. Os sonhos da noite passada que o digam. Sonhei com petistas, tucanos, eleições, manifestantes e protestos. Garantem os especialistas que tudo o que sentimos, vemos e vivemos é refletido nos sonhos, porque nosso cérebro nunca para de funcionar, mesmo naquele sono profundo de um porre.

No sonho, em plena corrida eleitoral pela Presidência da República, manifestantes de vermelho convulsionavam pelas ruas. Vitrines apedrejadas, agências bancárias depredadas, ônibus queimados. O caos. Havia até pessoas com coquetel molotov em mãos, prontos para fazer ainda mais estrago. O que mais chamava atenção eram as faixas de “Lula traidor”. Como? Militantes querendo o couro do ex-presidente, aquele mesmo conhecido internacionalmente por tirar milhões da pobreza e que, mesmo preso, seguia sendo um ícone para a esquerda brasileira? Isso mesmo, gente com camiseta do PT gritando “Lula traidor”.

Condenado em segunda instância e, por isso, impedido de disputar as eleições presidenciais, Lula havia tomado uma medida dramática. Deprimido pelo isolamento do cárcere, sob vigilância do juiz Sérgio Moro, Lula abandonara o PT para se filiar ao PSDB.

No dia seguinte à decisão de virar tucano, Lula estava livre da prisão, respirando o ar puro da liberdade outra vez. Não sem duras críticas. Para os poderosos detentores do capital, Moro havia demorado demais para soltar o ex-presidente. Um novo tucano não pode ficar tanto tempo sem bater as asas.

Enfim, Lula poderia vazar de Curitiba. O friozinho agradável, as cafeterias, as araucárias, o transporte público de referência e os belíssimos parques, que tanto agradam os turistas, não apetecem muito o pessoal do colarinho branco. Os políticos certamente preferem outros destinos para as férias. Dizem as más línguas que o presidente Michel Temer (MDB) tem pesadelos toda noite com Curitiba.

Dias depois da soltura, Lula dava as caras na campanha presidencial de Geraldo Alckmin (PSDB). Daí, a convulsão social nas ruas. Nas regiões Norte e Nordeste, pela primeira vez na história, o PSDB venceria com folga a esquerda nas urnas. Dizem que o eleitor tem memória curta. Pode ser, mas quem passou fome nunca se esquece dos tempos de dificuldade. Por isso, Lula seguia imbatível nos rincões do País, independentemente da legenda partidária.

A cada nova pesquisa, Alckmin se aproximava mais próximo de uma implacável vitória no primeiro turno. Os tucanos já preparavam suas garrafas de Dom Pérignon para celebrar a conquista. Finalmente, o Brasil voltaria aos trilhos do desenvolvimento. Os bancos – que no auge da crise faturaram bilhões, explorando os trabalhadores com taxas de juros surreais – preparavam-se para faturar os mesmos bilhões, só que ao cubo.

Certamente, o mercado veria com bons olhos o resultado das urnas, o dólar cairia e os juros baixariam. Exceto os juros do rotativo do cartão e do cheque especial, claro, pois esses nunca caem. Do contrário, o que seria dos banqueiros sem as retiradas bilionárias todo ano.

Nas ruas, estava claro que os militantes de esquerda não aceitariam calados o desenrolar dos fatos. Che Guevara havia baixado neles. Lembro de ter visto uma amiga, líder sindical, nas manifestações. Ela, que participara do acampamento em frente à Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, agora era mais uma gritando palavras de ordem contra o ex-presidente.

No entanto, outra amiga sindicalista, fã incondicional de Lula, havia se filiado ao PSDB para seguir o mestre. Foi quando despertei, doido de vontade de tomar um cafezinho passado na hora. Que sonho esquisito. Ou teria sido um pesadelo?

Na vida real, tudo segue como no dia anterior. Preso e impedido de participar dos debates, Lula lidera as pesquisas. Pelas regras do jogo, a Lei da Ficha Limpa o impedirá de concorrer, mas o programa eleitoral na TV se encarregará, em tese, de transferir seus votos para o sucessor na chapa, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT).

Nas recentes pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL) segue em segundo, com Marina Silva (Rede) em terceiro e Ciro Gomes (PDT) em quarto. Com menos de dois dígitos, Alckmin surge no quarto lugar, fora do “pódio” e bem distante do segundo turno. Sem o apoio de Lula, o que só seria possível em sonho, o Dom Pérignon dos tucanos talvez tenha de aguardar mais quatro anos.


14 de agosto de 2018

Quero Café! Crônicas de uma saudosa redação de jornal

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Num tempo não muito distante, antes de o principal jornal de Maringá perder excelentes profissionais devido a salários atrasados, a redação desse periódico diário era vibrante, repleta de repórteres de todo naipe: tagarelas, rabugentos, espirituosos, sensíveis, compenetrados; sempre insatisfeitos com as fontes, com as pautas, com os editores, com a ligação telefônica que nunca completava, com a quantidade de toques para a matéria, com o café frio (ou com excesso de açúcar), com o frio do ar-condicionado...

Havia sempre algum motivo de reclamação, e o campeão da lista era o incômodo dead line (prazo limite para o repórter entregar sua matéria ao editor). "Quero Café! Crônicas de uma saudosa redação de jornal" conta, claro, alguns desses dissabores no jornalismo, mas vai muito além ao proporcionar aos leitores inúmeras alegrias de quem ama escrever, e tem a sorte de viver do que escreve.

Jornalista com mais de 15 anos de experiência em jornal impresso, Luiz Fernando Cardoso extrapola as quatro paredes daquela saudosa redação. O autor relata os bastidores de coberturas “na rua”, como na ida a um badalado show sertanejo, na aventura por trás da primeira manchete ou em algumas votações polêmicas na Câmara Municipal de Maringá.

As crônicas de “Quero Café!” também levarão os leitores a conhecer o universo desses jornalistas fora da redação, sem o estresse causado pelo dead line. Sim, jornalista também tem vida social, e no caso do autor e de seus colegas de redação parte das crônicas se passa em suas casas, no parque de diversões e em cafeterias da cidade, com um bom expresso para celebrar a amizade.

9 de agosto de 2018

Homem de bem

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A hora do jantar, em família, é sagrada para José Borges, 45 anos, casado, pai de um filho pequeno. Na mesa, a apetitosa comida estava ainda mais saborosa desde a reconciliação com sua senhora. Ficaram brigados por algumas semanas, depois que a raiva dele resultou em hematomas nela. Foi um desentendimento "por amor", dizia ele.

Borges jantava seu prato favorito, frango frito com batata inglesa assada, temperada com pimenta do reino, salsinha e azeite de oliva; quando o telefone fixo tocou.

— Poxa vida, bem na hora do jantar. Atende lá mulher, que eu trabalhei o dia inteiro.

A esposa estava exausta após a faxina, os cuidados com o filho, as compras no supermercado, os preparos do jantar, as aulas do curso de graduação a distância. Ainda assim, levantou-se da mesa e atendeu a ligação, sem reclamar.

— É seu amigo Nico. Quer falar contigo.
— Tem de ser agora?
— Ele insiste que é urgente.

Ainda mastigando um bocado de frango frito, Borges apanhou o telefone.

— Fala brother.
— Zé, seu celular está desligado? Tentei te ligar e não atendeu.
— Parou de funcionar. Vou procurar aquele ambulante filho da mãe para reclamar.
— Já te disse para não comprar na rua. Pode ser aparelho roubado — advertiu Nico.
— Mas diga lá, o que há de tão urgente?
— Você não viu? Seu vídeo passou na tevê para o país inteiro!

Ah, quem diria! O vídeo despretensioso de Borges, gravado na horizontal conforme as recomendações dos jornalistas da emissora, havia sido selecionado para o quadro “O Brasil que eu Quero”. A estratégia de gravar em frente à igreja matriz, cartão-postal da pequena cidade, pelo visto fora acertada.

Nos minutos seguintes, mais ligações atendidas pela esposa e outras interrupções no frango com batatas. Eram outros amigos contando a boa nova. No aplicativo de mensagens, que ele não podia acessar sem seu smartphone, Borges podia imaginas as centenas de felicitações pelo feito.

Zé, para os mais chegados, era um sujeito conhecido, benquisto na sociedade local. Motivo que explica os telefonemas. Após um dia puxado, Borges se sentia merecedor daqueles segundos de fama. Parecia um jovem youtuber com o sorriso no rosto pelo primeiro vídeo com um milhão de acessos.

Antes de revelar o conteúdo do vídeo que ganhou as telinhas de todo o Brasil, vale a pena relembrar o atarefado dia desse distinto cidadão. Pela manhã, pulou da cama por volta das 7h30. Deu uma rápida zapeada nos incontáveis canais de sua “gratuita” skygato. Reclamou do café da manhã: “Omelete, de novo”. Saiu sem se despedir da mulher, que acordara uma hora e meia antes passar o café e preparar a papinha do bebê.

Na saída de casa teve o segundo incômodo do dia – o primeiro fora a omelete. Na caixinha das correspondências, uma do departamento de trânsito o informava sobre uma multa tomada dias antes por avanço de sinal vermelho. "O que tem de passar um pagador de impostos nesse país injusto", esbravejou Borges, em pensamento.

Um pouco atrasado por conta da leitura da correspondência, trafegou cinco metros na contramão para não precisar dar toda uma volta no quarteirão. Ao menos ali, a prefeitura não havia instalado câmeras de vigilância para flagrar infrações de trânsito. Para Borges, as lideranças municipais deveriam se preocupar mais com bandidos, ao invés de punir gente de bem com uma “indústria da multa”.

Menos de dez minutos depois, o apressado condutor já estava na Câmara Municipal. Cargo, assessor parlamentar; salário, R$ 5 mil. Não tinha jornada definida de trabalho. Na verdade, dava as caras no gabinete duas ou três vezes por semana, e devolvia 40% do rendimento mensal para o vereador. O repasse ajudava a compor o caixa dois da campanha seguinte. Trabalho duro, mesmo, só no período de eleições, sob risco de seu parlamentar perder o mandato e, ele, a boquinha generosa. No poder público, sempre há teta para mais um.

Quando dava as caras, a permanência na Casa de Leis costumava ser de meia hora, salvo duas exceções: em dia de sessão com projeto de lei polêmico envolvendo seu vereador e quando a assessora gostosa de outro parlamentar estava na área, dando sopa. Sempre rolava uma paquera, ao menos da parte dele, na cantina dos funcionários do Legislativo, onde não havia câmeras.

— Jordana não está por aí hoje? — perguntou Borges, sobre a cobiçada assessora parlamentar.
— Tome jeito, Zé — respondeu a secretária do vereador, um sujeito de extrema direita, pouco dado a minorias e “gente da senzala”, como o próprio edil costuma dizer.

O vereador tinha grande estima por Borges, “um dos seus”, apesar das passagens do assessor pela polícia por agressão doméstica e injúria racial. Contudo, o parlamentar, um moralista, desaprovava as cantadas do assessor casado à colega do Legislativo. O que diriam os eleitores se descobrissem. Entre seus apoiadores nas urnas estava fiéis da Galáxia do Reino de Deus, algo assim.

— Bom, já que a gatinha do gabinete vizinho não está, vou cair na estrada.
— Com esse tempo de chuva, Zé?
— Sim, as encomendas não param. Quer alguma coisa?
— Duas garrafas de gim. Não esquece.

Por conta de seu horário flexível na Câmara, Borges tinha tempo de sobra para suas idas e vindas do Paraguai. Com as muambas, conseguia triplicar as rendas do mês. Trazia de tudo, laptops, iPhones, pneus, televisores de tela plana, videogames, cigarros etc. Só não mexia com drogas ilícitas, porque homem de bem tem de dar bom exemplo.

Deu azar uma única vez. Foi pego na aduana, perdeu tudo o que estava acima da cota limite e aprendeu com aquela dura lição. Agora, Borges faturava ainda mais ao voltar do "Paragua" com sua caminhonete abarrotada de produtos. O esquema na fronteira era bom para ele e para os fiscais, que ganhavam uma gorjeta generosa por semana para fazer vista grossa. O próprio vereador, ambulante antes de ser eleito, foi quem lhe ensinou o caminho das pedras, ou melhor, da "fiscalização zero".

No retorno à cidade natal, para não perder o hábito, parou na estrada para tomar sua caninha. Na casa das primas, tinha a carícia certa lhe aguardando. Pagava bem para escolher, e escolhia a opção mais arrebitada. “Isso é coisa de homem”, já dizia seu avô. “Homem é assim mesmo”, dizia sua avó, conformada. Àquela altura, a esposa já havia posto a mesa do jantar.

Pegar estrada esburacada não é tarefa fácil. Quando chovia forte, como era o caso naquele dia, Borges reduzia a velocidade e bebia apenas uma cachacinha, sem a saideira. Varado de fome, deixou as encomendas para entregar na manhã seguinte, já que não precisaria bater ponto na Câmara.

Aliás, meses antes, Alves, o parlamentar esquerdista FDP, tentara impor a obrigatoriedade de ponto biométrico na Casa de Leis, mas, felizmente, seu vereador havia conseguido o apoio da maioria para vetar a proposta. A "normalidade" de sempre seguia sendo a regra.

— Olá, Zé, como foi seu dia? — perguntou a esposa, no retorno do marido ao lar.
— Muito puxado, como sempre. O trânsito na fronteira e o vai e vem dos muambeiros nas lojas me estressam, você sabe. E com a chuva, pior ainda.
— E na Câmara, tudo certo?
— Não tinha nada para fazer lá. O dia de receber os pobres pedintes no gabinete é só na semana que vem.

A pergunta da esposa sobre a Câmara não era por suspeita da paquera indevida, mas por preocupação. Ela tinha ouvido na rádio, enquanto limpava a casa, que o promotor estava investigando denúncia de funcionários fantasmas.

— O quê? Que promotor desocupado. Não tem bandido para prender não?
— Isso te preocupa?
— Claro que não, porque o trabalho de um bom assessor é na rua, falando com o povo.
— Quem você acha que fez essa denúncia?
— O FDP do Alves, com certeza. 

Como a mesa já estava posta, Borges desandou a comer. Foi quando o telefone tocou. O assessor chegou a pensar que seria seu vereador, mas era o amigo Nico, trazendo a boa nova. O que os amigos viram na telinha foi um Zé boa pinta, gel no cabelo, camisa branca bem passada, pedindo no horário nobre por “um país com melhores estradas, com menos impostos e sem corrupção”. Um belo discurso, digno de um cidadão de bem, apesar da hipocrisia.


7 de agosto de 2018

Como ler um e-book

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Muitos amigos, mais habituados aos livros tradicionais (como quase todo mundo), me perguntam: "Como faço para ler um e-book?" Vou confessar que até alguns anos eu também não tinha a menor ideia.

O bom é que não há segredo. Posso garantir que é mais fácil do que acertar uma cesta de três no basquete ou correr 3 km no entorno do bosque. Na verdade, para quem testa e se adapta aos livros digitais, eles logo se tornam muito mais práticos do que os livros impressos.

Assim como "Orfeu e Violeta: E outras histórias lá de Pato Branco", meu segundo livro, "Quero Café! Crônicas de uma saudosa redação de jornal", é um e-book em formato Kindle. Ou seja, é multimídia. Dá para ler também no seu smartphone, tablet, laptop (notebook) e PC.

Na minha opinião, o Kindle proporciona a melhor experiência. Leve e silencioso, o aparelho da Amazon tem uma tela que simula a leitura no papel (por não emitir luz), é capaz de suportar biblioteca com mais de 5 mil títulos e sua bateria pode durar semanas. E está cada vez mais em conta, com modelos a partir de R$ 219.

Para adquirir os e-books "Quero Café!" e "Orfeu e Violeta" é preciso se cadastrar na Amazon (mesmo procedimento para comprar qualquer coisa na loja). Se você tem um Kindle, em alguns segundos o livro aparecerá no seu dispositivo.

Mas se você não tem um Kindle, basta baixar no seu smartphone o aplicativo de mesmo nome, fazendo login com o e-mail cadastrado na Amazon. O e-book comprado aparecerá no aplicativo, seja no tablet ou celular.

Por fim, para quem prefere ler no PC/laptop, o acesso se dá pela nuvem. Conectado à internet, acesse o Kindle Cloud Reader com seu login da Amazon. Pronto, o livro comprado estará lá, prontinho para ser lido. O bom é que é tudo sincronizado, como mostra a imagem desta postagem!

Aí, é só preparar um bom café e mandar ver na leitura. Não disse que era mais fácil que dar a volta no bosque correndo? Para quem sabe ler e tem boa vontade de aprender, o céu é o limite.